[!por ora, sem título!]
[Florianópolis - UFSC - XXXIII Encontro Nacional de Estudantes de Letras]
– Vamos lá, ele está sozinho.
– Vai dar certo?
– Só vamos ter essa chance. Ele não pode escapar.
Um a um, eles foram chegando e se arrumando. “Está muito fácil”, um deles pensou. “Você e você”, outro disse, “fiquem perto daquela porta. Você e você”, apontou para outros dois, “esperem do lado de fora para pará-lo caso ele saia”. Estava quieto demais, fácil demais, não estava certo. Ele não facilitaria daquele jeito em momento algum. Por que ainda não havia saído dali? Os dois rapazes fizeram acenos de cabeça para as duas moças: havia chego o momento e cada dupla foi de um lado. A forma que ele baixou os olhos enquanto tomava o café preto fez a ex-namorada perceber...
– Pois é, mano – Chico disse –, obrigado por deixar a gente na mão em Marabá – sentou-se na cadeira ao lado.
– É – Lucas, já sentado, continuou – falou tanto que ia e, no fim, sumiu. O Camelô foi muito feliz em dizer que você viria a Floripa – Érica e Paloma apareceram pelos flancos e puxaram cadeiras. Todos olhavam para ele. Que tomou mais uma dose, amaldiçoando a lanchonete, devido o fumo ser proibido.
– Vocês respiram muito alto – ele disse com as mãos às pontas dos braços da cadeira –, são desorganizados e indiscretos – era impassível. Não me admira que não tenham me pego a mais tempo. Mas digam – estendeu a mão como se mandasse tudo às favas –, perguntem o que vieram perguntar, o que os aflige desde fevereiro, que eu sei que ‘tá fazendo vocês me procurarem desde fevereiro e... – Os quatro enrubesceram de raiva verdadeira – “... e nos ter feito correr atrás dos próprios rabos desde fevereiro quando você ‘tava embaixo dos nossos narizes”, Érica disse, decepcionada. Por seu olhar, era óbvio que havia um sorriso formado embaixo da barba. Lucas fez um sinal a interrompendo.
– O que aconteceu para não ires ao EPEL, Rafael? – Paloma perguntou.
Silêncio.
Ele suspirou.
Eles não desviaram os olhares dele.
– Eu poderia dizer que eu não quis – começou – mas não foi bem isso, sabem? Não, não foi isso – abria e fechava as mãos. – Não é fácil explicar.
– Tem ideia do que aconteceu lá, mano? – Lucas perguntou.
– Absoluta – ele disse. – Fui muito bem informado de praticamente tudo que aconteceu lá. Vocês inclusive – sorriu – me disseram muita coisa sobre as cagadas. Fabíola, o tal Artur Ribeiro, Kaius (esse é o nome, certo?) e Marcelo não são os melhores cofres do mundo. Fora que o povo do CAL também contou as histórias até cansarmos de ouvir.
– Mas... Como? – Érica, Paloma e Chico se perguntaram.
– Simples. Como a própria Érica disse, eu disse que não estava a vista dos olhos de vocês, não que não estava por perto. Ajuda muito não falar muito quando você não quer ser visto – funcionou na maioria das vezes e...
– Tu ainda não respondestes nossa pergunta – Érica disse. Ele abriu as mãos e as fechou firmemente, além da inspiração.
– Lembram porque fez tanto sol na manhã da viagem ao EPEL? – perguntou, recebendo olhares de negativa – Porque havia chovido quase a madrugada inteira da segunda pra terça. – “E daí?”, podia ser lido nos olhos deles – Começou como uma mensagem no celular, “abre o portão”. Quem seria tamanhas quatro da manhã? Lembra, Lucas, ‘távamos falando sobre o isopor pra levar a carne e o frango e não havíamos entrado em consenso e tu dissestes “tudo bem, o Chico e eu pensamos em algo de manhã, não te bate”? – Lucas confirmou mas querendo saber como aquilo estava relacionado; dose de café. – Ela usava uma capa de chuva preta. Estava toda de preto, pra dizer a verdade, seus cabelos eram negros que nem a capa e a roupa, totalmente ao contrário da pele muito branca e dos grandes olhos azuis redondos e brilhantes. Até o batom era preto. Abri o portão para que entrasse e ela tirou a capa. Nem esperou entrar pra perguntar se eu já tinha terminado de preparar tudo pra viagem – olhou para o café, quase no fim. Fez sinal par uma atendente pedindo mais um duplo. “‘Tá certo”, Chico disse, “e essa mulher disse pra tu não ires pra Marabá, certo?” O barbudo sorriu. – Exato. Vamos lá pra fora pr’eu poder fumar. Podemos? – Os quatro se entreolharam. Lucas levantou, os três foram em seguida. Érica apontou para ele, que a cortou – Prometo não fugir. Vocês precisam ouvir isso – o café chegara e pediu para que fosse posto na conta.
Minutos depois, outro lugar, ainda no campus. “Certo”, Chico disse. “Ok”, ele disse, “agora as coisas começam a ficar loucas”, estava empolgado, já com o cigarro aceso, cumprimentava as pessoas que vinham falar com ele. “Já no meu quarto”, prosseguiu, “ela me deu um pen drive, dizendo ‘veja o que tem aqui’. Ok. Pus no PC e vi as pastas ‘Fotos’, ‘Videos’ e ‘Depoimentos’. O próprio nome do pen drive já era ‘EPEL 2012’”. Érica perguntara o que havia nas pastas, tendo como resposta “relatos em imagem, áudio e vídeo do que teria sido o encontro caso ele tivesse ido”. “E você quer que acreditemos nisso, certo?”, Lucas perguntou. Silêncio. Os quatro estavam irados com aquela ofensa às suas inteligências, não acreditavam que ele acreditava que eles fossem tolos a ponto de acreditar nisso. Até que... Ele colocou o cigarro na boca e, com a mão já livre, procurou algo no bolso da bermuda próximo ao joelho, retirando triunfante um
“Um pen drive?”, os quatro ficaram mais irritados e mais a nível crescente quando ele pediu por um computador, que não demoraram para conseguir. Alguém devia ter tirado fotos deles quando enfim viram os conteúdos do dispositivo de armazenamento de dados, ouvindo e vendo a si mesmos falando do que ele aprontara enquanto bêbado e estando no estado que se encontrara no evento em questão, o porque (não justificável nem desculpável) de ter feito o que fizera. Desligaram e foram até ele, que já estava com outro café e outro cigarro, conversando com Tailson e a esposa deste, além de alguns outros, como Clederson, Isabelle, Patrik, Laura, Daniela e Raimundo. Tailson e ele eram os que riam mais alto, como se o evento nunca tivesse ocorrido ou, muito pior!, como se nunca tivessem tido a obrigação de participarem do mesmo. Mais do que o frio, aquilo os angustiava. Aquilo estava tão além das compreensões deles que realmente os angustiava. Paloma foi até ele.
– POR QUÊ? – ela questionou levantando em muito a voz. – Você sabia que ia acontecer e podia evitar. Podia ser tudo diferente hoje! Me diz! POR QUÊ? – As nuvens estavam cada vez mais acinzentadas, do cinza ao escurecer. A mesma pergunta estava nos olhos dos outros três que acompanhavam a moça. Muitos já haviam parado ao redor deles devido à cena – e ela estava se segurando para não chorar. Olhos negros em congruência com olhos castanhos e primeiros baldes de chuva. Ele, com os braços abertos de “porra, e agora?”, olhou para os amigos ao seu redor, eles – com exceção de Tailson – não entenderam. Acendeu mais um cigarro. “Não pergunte pra mim”, disse. E, com a mão ond’ele estava aceso, como se apontasse um revolver, apontou para trás da moça.
– Pergunte a eles.
Ela se virou. Os quatro haviam olhado para trás. Não podiam acreditar. Os traços envelhecidos, as rugas, os olhares cansados, tudo indicava o óbvio que recusar-se-iam a acreditar até que não houvesse mais porque não acreditar...
Francisco. Érica. Eurico Lucas. Paloma.
Eram eles.
:: 04 de dezembro de 2013 ::
:: sobre o XV Encontro Paraense de Estudantes de Letras e o XXXIII Encontro Nacional de Estudantes de Letras ::